sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

Feminista ou feminina?



Apesar do feminismo estar presente, há longas décadas, na literatura, na mídia, nos ensaios acadêmicos, nos discursos – mais ou menos explícitos – do/as políticos/as, nas mesas de bar e até como assunto corriqueiro em piadas machistas, a velha expressão “sou feminina, não feminista”, ainda ecoa forte nas falas de muitas mulheres. O auto-referir-se “feminista”, mesmo diante de claras posições “pró-mulher”, parece trazer desconfortos que têm assento na histórica luta das mulheres contra sua opressão e os estereótipos a ela associados. “Sou feminina” parece sugerir uma antítese, que separa o campo do “natural identitário” do campo do político e do ideológico. Na referência “sou feminista” estariam implícitos adesão, certa coerência e uma atitude política, enquanto “sou feminina”, marcaria uma atitude de afirmação ligado ao estereótipo do que é ser mulher. Um, intriga e ameaça, enquanto o outro, apazigua e conforma.
Nem Simone de Beauvior escapou do preconceito, mas isso foi há pelo menos cinco décadas e por razões bem diversas. Filósofa francesa, escreveu o célebre “O Segundo Sexo” na década de 40, quando ainda acreditava que a revolução socialista resolveria a questão da desigualdade entre homens e mulheres. O livro tornou-se literatura de base para parte considerável das feministas ocidentais; porém, apesar de ter escrito uma obra de referência para o feminismo, Beauvior não se afirmava feminista, fato que foi admitir bem mais tarde, nos anos 70, quando o chamado “novo feminismo” francês estava no auge e quando ela própria havia aderido ao MLM (Movimento de Libertação das Mulheres). Em uma entrevista a Alice Schwarzer, ela declara: “Sou feminista”, afirmando sua convicção no movimento social das mulheres, específico, radical e autônomo.


Texto retirado do jornal "Fazendo gênero", do grupo Transas do corpo, de Goiânia - GO